“Por que a filosofia é uma forma
diferente de ver o mundo? Em primeiro lugar porque é um olhar que pressupõe
distanciamento. A excessiva proximidade de um objeto pode interferir na nossa compreensão
sobre ele. Um passo para trás pode nos ajudar a ganhar uma perspectiva mais
ampla. Agora imagine que a realidade é como uma parede contra a qual nossa face
está colada. Tão próximos assim, torna-se difícil apreender o tamanho, extensão,
espessura ou até mesmo a cor dessa parede. Olhar filosoficamente a realidade implica
um certo afastamento dessa parede que está diante e em torno de nós.
Infelizmente, porém, na perspectiva de quem continua com seu rosto colado na
parede do real, aquele que se distancia parece ter perdido sua conexão com o
mundo, soando e agindo como se fosse louco. Ao contrário, trata-se aí de um
afastamento que visa a uma perspectiva mais rica e profunda da realidade. Uma
das diferenças entre a loucura e a filosofia consiste justamente no fato de que
a primeira é um estado de permanente desvinculação do real, ao passo que a
segunda promove apenas um distanciamento provisório e estratégico.
O olhar filosófico também é diferente
porque envolve a capacidade de sentir admiração. Aristóteles diz na Metafísica:
‘O homem que é tomado da perplexidade e admiração julga-se ignorante’
(Metafísica, 982 b 13-18). Não se trata de ter admiração por algo ou alguém,
mas de admirar-se com o próprio mundo. Esse sentimento de espanto geralmente acontece
diante de algo extraordinário, como quando algo de inusitado acontece: um ato desequilibrado
de uma pessoa sabidamente serena; ou ainda a ocorrência de um fenômeno natural
incomum, tal como um furacão ou a erupção de um vulcão. Todavia, a admiração presente
no ver filosófico é voltada principalmente para as coisas que tomamos por
habituais e com as quais estamos familiarizados. Existem na vida cotidiana
diversas situações assustadoras e maravilhosas que provocam a sensação de que
as coisas talvez pudessem ser de outra maneira. Então surge a pergunta ‘Por quê?’.
Por exemplo: por que o homem tem que morrer? Ou por que temos tanto prazer
vendo um filme ou ouvindo uma música? Ou, ainda, por que é ao mesmo tempo tão
importante e às vezes tão difícil conviver com outras pessoas? Tais questões
surgem quando nos sentimos desconfortáveis na realidade, mesmo que ela pareça
óbvia e evidente para os outros.
O olhar de admiração do filósofo é
parecido com o olhar infantil: não se trata de uma visão de raios X, capaz de
penetrar os mais sólidos obstáculos, mas de um olhar espontâneo e irreverente.
O modo infantil de olhar está apto a enxergar o que todos podem ver, mas não
conseguem por causa do hábito, do medo ou da preguiça. Infelizmente o olhar de admiração
está em processo de extinção – deixamos de nos surpreender com a morte e a violência,
algo que antes era inimaginável e absurdo. A miséria das grandes cidades, por exemplo,
tende a se tornar banal através da sua superexposição pela tevê e pelos
jornais. Contra a banalização do real, a filosofia surge como uma oportunidade
de ressensibilização do nosso olhar, anestesiado por belas ilusões.
Finalmente, para se praticar o olhar
filosófico é preciso muita paciência. Vivemos em uma época em que nossas
atividades estão muito aceleradas. O volume de informações a que estamos
submetidos é gigantesco e somos exigidos a gerenciar todos os dados em um
piscar de olhos, promovendo conexões e decisões rápidas. A linguagem do
videoclipe é adequada a esse tipo de olhar: cortes bruscos, enredo fragmentado,
fusões e sobreposições de imagens. O olhar videoclipe tem suas vantagens; ele
evita que nos sufoquemos no oceano de sinais sonoros e luminosos, fortalecendo
nossa habilidade de selecionar e administrar as informações. Por outro lado,
estamos perdendo nossa capacidade de contemplar demorada e desinteressadamente
o mundo. Somente quando praticamos um olhar não violento sobre as coisas, sem
forçar classificações ou inter-relações, deixando elas serem o que são, é que o
real pode se mostrar em toda sua complexidade e beleza. O olhar filosófico é
lento, não tem pressa de chegar a lugar algum, pois sabe que é essencial ater-se
aos detalhes.”
FEITOSA,
Charles. Explicando a filosofia com arte. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004. p. 27-31.
a atividade tá difícil, não seii fazer, help me !!!!!!!!
ResponderExcluirdeixe de coisa sandrinho -_-
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